Do Mérito

        O projeto de lei tem por finalidade criar mecanismos de proteção aos direitos básicos dos consumidores que pela total ausência de informação são constantemente surpreendidos com valores acima dos que foram inicialmente contratados.

        Isto ocorre porque as empresas de telefonia fixa e móvel não informam aos seus clientes quando estes excedem o limite da franquia contratada. Nesse momento os minutos cobrados além da franquia passam por um processo de tarifa diferenciada. O que onera em muito os valores anteriormente contratados.

        Um dos problemas que os usuários de telefonia móvel pós-paga estão propensos a sofrer é a fatura além da franquia. Boletos ou débitos em conta, no fim do período mensal previsto em contrato, que ultrapassam o valor do pacote de minutos e mensagens. Este é motivo para medo e susto nos consumidores, que gostariam de ser avisados antes de estourar seus limites.

        Pesquisa desenvolvida pelo IDEC (Instituo Brasileiro de Defesa do Consumidor) aponta que 97,8% dos entrevistados gostariam que as operadoras avisassem quando suas franquias dos planos de telefonia móvel chegassem ao fim. Apenas 2,2% dos participantes acham desnecessário este tipo de serviço.

        Na avaliação do advogado do instituto Guilherme Varella, o consumidor que utiliza os serviços das operadoras seriam beneficiados se o aviso existisse no País. “Os usuários ganhariam mecanismo de controle, para que saibam quanto de fato estão gastando e as cobranças indevidas poderiam diminuir”, avalia.

        Segundo o IDEC, a pesquisa foi baseada na medida de agência do setor de comunicação norte-americana. A FCC (Federal Communications Commission) obrigou que as operadoras dos Estados Unidos avisem seus clientes quando chegarem no limite dos seus planos, tanto para voz, quanto transmissão de dados e internet móvel.

        “Esta mensagem contribuiria para o controle do orçamento do consumidor. Ainda mais que alguns acabam gastando mais com celular do que com comida”, diz o professor de Finanças Adriano Gomes, que ministra aulas no Curso de Administração da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

        A falta de mecanismos de controle acabam por facilitar o cobrança de valores exorbitantes e consequentemente aumentam a inadimplência, levando diversos consumidores a terem os sues nomes inscritos no malfadados cadastros de maus pagadores.

        Assim sendo, o presente Projeto de Lei tem como objetivo obrigar as empresas a disponibilizar os mecanismos necessários na defesa dos direitos dos consumidores.

Da Clareza e Precisão do Projeto

        O propósito da presente Lei é a introdução de definição legal na sistematicidade jurídica vigente no Estado de Mato Grosso, conforme inciso I do § 2º. do artigo 9º. da Lei Complementar nº. 06/90. Ademais, o Projeto segue cabalmente as disposições do mesmo diploma legal, em especial o disposto no artigo 8º.

Da Possibilidade de Iniciativa

        Neste se trata de normas consumeristas, que o Parlamento Estadual possui competência concorrente para legislar, nos termos do artigo 24, inciso V e VIII da Carta Constitucional.

        Mister se faz ressaltar que não há no bojo da propositura qualquer atribuição dada a nenhuma Secretaria. Não elenca qualquer das Secretarias e Estado ou órgãos da Administração. Não implica despesas para o erário, pois contém enunciado de caráter meramente genérico.

        O escopo do presente está inserido, mormente, no art. 7º., inciso XVIII, da Constituição Federal. De igual forma, o projeto não tem qualquer vício de intenção de usurpação da prerrogativa de iniciativa de processo legislativo, e, sim a concretização de um dos objetivos fundamentais do Estado Democrático de Direito descrito no artigo 3º da Constituição Federal Brasileira:

 

Artigo 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

                

        Poderíamos elencar outros comandos constitucionais, como o princípio da dignidade humana, onde o valor da dignidade da pessoa humana deve ser entendido como o absoluto respeito aos seus direitos fundamentais, assegurando-se condições de dignas de existência para todos.

        Em análise superficial, o Projeto em tela confrontaria o princípio constitucional da Separação dos Poderes e ofenderia as autonomias administrativas do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso, contrariando o disposto no art. 39 da Constituição do Estado.

        No entanto, uma visão aprofundada cobra relevo destacar que a separação de poderes é, primeiro, mecanismo de repartição de funções, de tal forma que cada um dos poderes, a seu turno, se especialize em sua matéria e, segundo, instrumento de contenção dos poderes, permitindo-se, pois, que um fiscalize o outro.

        Não é vedado, porém, que um auxilie o outro, caracterizando uma interdependência necessária, natural e salutar.

        Imperioso trazer à colação os comentários de Paulo Bonavides acerca da necessidade de uma reavaliação do princípio da separação de poderes: "Numa idade em que o povo organizado se fez o único e verdadeiro poder e o Estado contraiu na ordem social responsabilidades que o Estado liberal jamais conheceu, não há lugar para a prática de um princípio rigoroso de separação" [1].

        Consta do art. 2º da Constituição Federal de 1988 que "são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário". Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário são expressões que possuem duplo sentido, pois exprimem as funções legislativa, executiva e jurisdicional e indicam os respectivos órgãos. Em verdade, o poder é uno, sendo dividido em funções.

        Acresce-se o fato de que os poderes estão de tal forma repartidos e equilibrados entre os diferentes órgãos que nenhum pode ultrapassar os limites estabelecidos pela Constituição sem ser eficazmente detido e contido pelos outros, ou seja, num sistema de "freios e contrapesos"[2].

        O princípio da separação de poderes vale unicamente por técnica distributiva de funções, e não em termos de incomunicabilidade, antes sim de íntima cooperação, harmonia e equilíbrio, sem nenhuma linha que marque separação absoluta ou intransponível[3].

        Dessa forma, deve-se aferir o sentido do princípio da separação de poderes em relação à função legislativa, observando que o exercício da função legislativa pelo Poder Executivo é decorrência natural da evolução do Estado, sendo necessariamente compatível com a democracia e a separação dos poderes, com essa competência manifestando-se por várias formas no Estado de Direito contemporâneo.

        Ademais, resta salientar que a aparente antinomia de princípios hão de ser realizados – sua resolução –, via leitura sistemática da Constituição Federal, visando o seu conteúdo global e conteúdo jurídico, sopesando a razoabilidade e a proporcionalidade da matéria. Uma leitura hermenêutica da Carta Magna caberia apenas ao Constituinte Originário.

Os conflitos de regras são resolvidos na dimensão da validade, em que a aplicação de uma regra importa na não-aplicação da outra.

        Obviamente, esse tipo de lei é possível de sanção. Nada exclui de sanção nem de veto. Quanto à possibilidade de argüição de inconstitucionalidade por vício de iniciativa, e pelos motivos expostos, esse tipo de lei não é passível de semelhante argüição. Pelos fundamentos já enunciados, não há, em princípio, vício de iniciativa.

        Por derradeiro, o contexto em que se situa o Poder Legislativo, expressão que, na teoria da divisão de poderes, exprime duas idéias necessariamente interdependentes: (a) poder legislativo no sentido de função legislativa, como está no art. 44 da CF/88 e no art. 39 da Constituição Estadual. (b) Poder Legislativo no sentido de órgão ou órgãos que exercem a função legislativa – e é o sentido que está no art. 2º. Da CF/88 quando declara que são Poderes da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário (aí a independência orgânica).

        Poder Legislativo é, pois, o órgão coletivo (ou conjunto de órgãos coletivos) compostos de membros eleitos pelo povo destinado a exercer a função de legislar, sem prejuízo de outras que a doutrina costuma destacar.

        Quando se fala em funções do Poder Legislativo, está-se pensando nas funções que se atribuem aos órgãos desse Poder. Esquematicamente, podemos dizer que as funções fundamentais do Poder Legislativo são de representação, a de legislação, a de legitimação da atuação governamental e a de controle.

        Por fim, a possibilidade de iniciativa da presente matéria está esculpida no artigo 25 da Constituição Estadual e no artigo 24, V e VIII da Constituição Federal.

        Resta caracterizar que a iniciativa desta Lei, se não atendido pelo asseverado no acima elencado, está assegurada, pois o artigo 26 da Constituição do Estado determina que nas interpretações possíveis deverá haver o zelo pela preservação da competência legislativa da Assembléia Legislativa[4].

        Pelos motivos expostos Senhor Presidente, aguardo pela aprovação do presente Projeto de Lei pelo Plenário desta Casa.

[1] BONAVIDES, Paulo. Ciência política, 10ª ed. rev. e atual., São Paulo: Malheiros, 2001, p. 146.

[2] Adaptação do "checks and balances" do direito norte-americano.

[3] Paulo Bonavides, ob. cit., p. 147

[4] “Art. 26 É da competência exclusiva da Assembléia Legislativa: (...) IX - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes;”